Sertão Hoje

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Fabiano Cotrim

É professor e advogado do escritório "Cotrim, Cunha & Freire, Advogados Associados", em Caetité. Membro da Academia Caetiteense de Letras (cadeira Luís Cotrim), Mano, como é conhecido, gosta mesmo é de escrever poesias, mas, desde os tempos de Maurício Lima, então batucando na sua velha Olivetti Lettera 32, colabora com o Jornal Tribuna do Sertão, sempre nos mandando crônicas.

Crônicas da pandemia - Parte V: O pastor e a fila

Se ia bem? Glória a Deus Senhor, ia muito mais melhor do que bem, amigo. Ponto bom, som potente, púlpito, cadeiras brancas de plástico novinhas, tudo da Tramontina, tudo coisa fina. Pouco mais de um ano de funcionamento e eu já tinha batido todas as metas da matriz. Tanto que uns dias atrás, antes dessa porra toda cair nas nossas cabeças, essa histeria, essa gripezinha que a mídia tratou de elevar à condição de peste bíblica, o próprio bispo me ligou dando os parabéns e tal. O próprio bispo! Não foi secretário ou um daqueles que vivem lá na sede puxando o santo saco daquele homem santo, e por isso mesmo me pareceu uma promoção, uma esquina boa em uma capital ou cidade grande, bem maior do que esta e pronto! Veio decreto, veio lei, um ou outro dizem que pegou a gripe amaldiçoada e pronto. Igreja fechada, irmão, fechada.

E igreja fechada, meu irmão, é como circo sem lona. Não pinga nenhum real. Sabe como é, milagres acontecem, mas dinheiro não vem a nós por milagres. Grana, irmão, bufunfa, cacau, prata, dá trabalho pra ganhar. Eu sei, eu sei, todo mundo pensa que o nosso trabalho é moleza, que é só largar o verbo e o tutu enche as nossas burras. Mas nan na nin na não, irmão, nan na nin na não. O buraco é mais embaixo, ou mais em cima, conforme se tratar do céu ou do inferno. Pra começar o fiel não é fiel. É mais cliente do que fiel. Quem tem de fidelizar o rebanho todo dia é quem cuida do gado, irmão. Chamar cada qual pelo nome, tratar de forma especial cada um. Ah, em nome do Pai, terceirização nesse ramo não funciona. Tem que ser olho no olho, mão na massa, sem máscara.

Veja agora, cadê os fiéis? Cadê? Graças a Deus chegamos ao poder, aqui também, e a Prefeitura relaxou as pregas. O expediente na igreja voltou ao normal, mas cadê o povo de Deus, irmão? Veio? Vieram? Nan na nin na não. Estão com medo do que nem existe. O nosso Presidente, um Messias até no nome, fala todo dia que isso é coisa de comunista, sai, come cachorro quente na rua, abraça o povo, beija criancinhas, mas pensa que todo mundo é crente nele? Mesmo os crentes? Nan na nin na não. Sumiram, se entocaram feito ratos, com medo de pegar o vírus da Globo.

Falar na Globo, eu vi no jornal que essas filas da Caixa estavam mais rápidas, mas essa aqui tá demorando, tá não, irmão?

- Nan na nin na não.

Disse o outro com cara de enfado que mal se via por causa da sua máscara.