Sertão Hoje

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Fabiano Cotrim

É professor e advogado do escritório "Cotrim, Cunha & Freire, Advogados Associados", em Caetité. Membro da Academia Caetiteense de Letras (cadeira Luís Cotrim), Mano, como é conhecido, gosta mesmo é de escrever poesias, mas, desde os tempos de Maurício Lima, então batucando na sua velha Olivetti Lettera 32, colabora com o Jornal Tribuna do Sertão, sempre nos mandando crônicas.

Crônicas da pandemia - Parte VIII: O banco

Solidão. Não, profunda solidão. Quando e se tudo isto passar eu me lembrarei desses dias assim: dias de profunda solidão. Ressalve-se que houve um ou outro instante de aconchego, mas o que imperou na minha vida depois desse vírus aí foi a solidão, não tenho dúvida. Acabaram-se os encontros, sobretudo os encontros mais ternos, daqueles demorados nos quais os envolvidos perdem a noção do tempo, do espaço, e põem-se a falar as coisas mais lindas do mundo um para o outro. Os olhares trocados nessas ocasiões, quanta intensidade. Era tanta luz que me invadia nessas horas que eu, mesmo sendo um simples banco de jardim, me sentia agraciado pela sorte.

Que vida a que eu tinha! Que vida! Minha posição é estratégica, não sou do tipo banco ostentação, daqueles que brigam para ficar no centro da Praça, e calhou de eu ficar num cantinho protegido pelas flores do jardim, ao lado das quaresmeiras, luz indireta incidindo, pôr-do-sol me pegando em cheio. Aí já viu, né? Virei o banco dos namorados, dos que se amam e tanto se amam que levam o seu amor para passear à tardinha, à noite, na madrugada. E isto moldou a minha personalidade. Sou um romântico incurável. Cada história de amor e de desamor que testemunho é para mim um drama meu. Vivo a história, mergulho na história, sinto a história. Você me entende?

Então, eu não tinha do que reclamar. Não tinha. Aí veio o vírus e com ele foram-se os amantes. Restou a solidão concreta, palpável de uma praça quase vazia de gente. Um ou outro gato pingado, e mesmo assim de passagem, desconfiados, temerosos de viver ao ar livre. Isso me abalou muito. É como se de repente eu não tivesse mais nenhuma utilidade, afora o medo de realmente nunca mais vir a ter. Sou pequeno, um banco de praça de cidade pequena, já disse, e se forem manter para os namorados essa tal de distância segura, será o meu fim, a minha ruína, Oh céus, oh vida cruel...

Quem tem me consolado é uma quaresmeira amiga, esperançosa como todas elas costumam ser, que está sempre repetindo vai passar, vai passar, banquinho amigo. Ela é assim, a rainha do diminutivo, uma fofa. E se duvido, como foi nesse instante, antes de vir falar com você, ela traz argumentos realmente animadores. Diz, por exemplo, que esse meu temor de distanciamento para quem se ama é coisa a toa. Se eu já vi o amor respeitar limites, barreiras, se eu já vi humanos resistirem à sua força. Isso me anima, confesso. Ela tem razão, eu penso. E você, o que me diz?